Num mundo em que há cada vez menos peixe no mar é difícil perspectivar o rumo que uma Região pequena como a nossa deve trilhar para permitir de forma sustentável, esta que é uma atividade ancestral e importante para as comunidades que dela vivem.
Infelizmente e socorrendo-me de dados da FAO - Organização para a Alimentação e Agricultura (relatório SOFIA - versão de 2022), que monitoriza mais de 500 populações de peixes em todo o mundo, em 2022, quase 35% destas populações são consideradas excessivamente exploradas em comparação com os 10% identificados em 1974. Para estes números contribui decisivamente o consumo humano, que neste ano chegou aos 157 milhões de toneladas de recursos aquáticos cultivados ou capturados (à exceção das algas), no que foi considerado um novo record de consumo, que atinge agora os 20,2Kg per capita, valor este que é o dobro do consumido na década de 1960.
No nosso país estes números são surpreendentemente superiores. Portugal é o maior consumidor de peixe por habitante na EU e o terceiro a nível mundial. O consumo de peixe em Portugal (55,6 kg/per capita/ano) é mais do dobro do consumo médio na EU-27 (Fonte: FAO).
Estes grandes consumos implicam a implementação de apertadas quotas de captura nos peixes não criados em cativeiro, que determinam a quantidade de peixe que pode ser pescado em alto mar durante um determinado período. Estes constrangimentos acabam por ter várias repercussões no tocante aos apertados controlos de captura, reduzindo por via disto o rendimento disponível dos homens que se fazem ao mar nesta atividade e torna estes produtos mais caros aos consumidores finais, visto que a oferta acaba por ser menor.
Sabemos que a lapidação das espécies não são consequência da tradicional pesca levada a cabo pelas frotas da região, mas sim das grandes frotas que praticam a pesca de arrasto, muito protegidas pelos seus países e lobbies europeus. Na verdade, pagamos todos, consumidores, armadores e pescadores, em particular das regiões ultraperiféricas cujo peso é diminuto neste mar de “tubarões”. As Autoridades Regionais pouco conseguem fazer para inverter estas situações por não terem acesso direto aos centros de decisão reservados as autoridades nacionais. Para atenuar e evitar mais cortes as regiões como a RAM obrigam-se a manter estudos atuais dos stocks e inovar para diariamente tornar os produtos da pesca diferenciados pela sua qualidade, tentando assim manter o seu valor comercial, num mercado em que pela quantidade não se pode nem se deve competir. É na exigência, na segurança alimentar e na qualidade que podemos vencer no mercado interno e além-fronteiras.
Há é que apostar noutras formas de colocar peixe na mesa dos consumidores. É inevitável e é o futuro. Não é por acaso que entidades internacionais como a FAO, a Comissão Europeia e até nacionais como o IPMA, defendem o consumo alternativo de peixes provenientes da aquacultura. Importa lembrar que cerca de 50% do peixe e outros produtos derivados consumidos no nosso planeta são, neste momento, produzidos em aquacultura a preços bastante mais competitivos e mais acessíveis aos bolsos da maioria dos cidadãos.
Felizmente este é um setor que aos poucos tem vindo a ganhar a confiança dos consumidores, em particular dos europeus, que contam com o controlo apertado feito pelas autoridades europeias, nacionais e regionais, se conseguindo assim não só a satisfação, como o crescimento do consumo, satisfazendo gradualmente o aumento da procura. A aquacultura é um setor que tem sido capaz de inovar e de encontrar soluções que permitam tornar cada vez mais segura e menos impactante a sua existência. Em termos políticos são muito poucas as vozes dissonantes em torno desta atividade económica, da esquerda à direita a consenso quanto a importância da sua existência, tem permitido o seu crescimento a pensar na sustentabilidade das espécies e do próprio planeta. Acredito que por cá também vá acontecer.
Roberto Rodrigues
10/05/2023
Fontes:
- FAO. “The State of World Fisheries and Aquaculture 2022”. ONU-FAO. New York, EUA. 2022. https://www.fao.org/documents/card/en/c/cc0461en
- RICO, Carolina. “Portugal consome muito mais peixe do que o resto do mundo, mas o futuro tem de passar pela aquacultura”. TSF. 2022. Artigo jornalístico. Link de consulta: https://www.tsf.pt/portugal/sociedade/portugal-consome-muito-mais-peixe-do-que-o-resto-do-mundo-mas-o-futuro-tem-de-passar-pela-aquacultura-14974016.html
- DOCA PESCA. “Consumo de Peixe em Portugal”. Consultado em 08/05/2023. Link: https://sites.google.com/site/docapescacreative/consumo-de-peixe-em-portugal
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